sexta-feira, 8 de outubro de 2010
Modernidade, talento e genialidade
É incrível como alguns dias de abstenção intelectual podem transformar significativamente nossos processos mentais, condutas e pensamentos. Ao mudar drasticamente de rotina, os livros reflexivos deixaram de me fazer companhia por algum tempo, Pouco tempo se for considerar o período em que andávamos juntos, e com essa mudança, uma floresta com tantos frutos de diversas cores, sabores, fragrâncias e texturas rapidamente deu lugar à aridez do comum, a rasura do simples, ao horror do pensamento massificado.
Ao bem aproveitar poucos minutos nessa tarde, ao ler duas ou três páginas de algo rico, volto a ter inspiração e qualquer brilho interior para me comunicar, absorvendo rapida e satisfatoriamente aquela porção como grãos de areia retém instantaneamente toda e qualquer porção de água que perto deles se situe.
Dessa vez, maravilhado pela simplicidade e profundidade de um relato, vejo mais verdade que há tantos anos busco, cultivo e repasso se materializando em meu âmago, onde contornos tênues mas impecavelmente desenhados constroem um conceito já conhecido a priori, mas nunca antes brindado com tal maestria.
Basta um pouco de observação e oportunidade para percebermos algumas qualidades que parecem sempre acompanhar grandes mentes, grandes exemplos. Quando buscamos no passado fontes de inspiração, alguns nomes e fatos históricos prontamente nos invadem o pensamento. É curioso o fato de que ao remeter nossa avaliação em face da vida de grandes exemplos, temos a imagem daquela vida sempre acompanhada por paz, sabedoria, tranquilidade, sonhos e realizações, e também humildade. Aqueles que amam o conhecimento e a temperança parecem pender naturalmente para uma personalidade, ou que seja, postura adquirida, tantas vezes minimalista, abstrata, com preocupações, temores e medos diametralmente opostas, ou mesmo estranhas ao que vemos incansavelmente nos cercar, através de pessoas comuns, no dia-a-dia.
Serão os tempos atuais tão perversos a ponto de ter extirpado esse perfil do nosso meio, terá acontecido algum tipo de seleção natural às avessas, a ponto de que tenham permanecido somente pessoas pequenas, com aspirações igualmente medíocres e feitos ainda piores, como constantemente é noticiado para os quatro cantos? Não. A verdade é que as grandes mentes, as grandes vidas sempre foram e sempre serão exceções notáveis. Seu estilo de vida, seus valores, seus focos e processos mentais se diferenciam quase que extraterrenamente do que é tipo como ordinário pela imensa massa de pessoas cuja mente já foi reduzida e aprisionada pela vida de conforto, pelas facilidades materiais e principalmente pela Sociedade do Espetáculo.
O que dá espaço, e motiva comportamentos como a autopromoção exacerbada, o que enseja em exageros, mentiras, falsas propagandas de alegria, realização, enfim; tudo o que é metralhado incessantemente nas mentes daqueles de todos que nela vivem, na maioria das vezes, sem possuir condição alguma de discernir sobre a procedência e as intenções sorrateiramente inoculadas no material que é jogado na cara de qualquer pessoa a todo instante.
Mas a questão é que todas essas premissas vão contra tudo o que se pode tirar de maior valor das vidas que mais dizemos louvar e ter como exemplo. Os maiores gênios da humanidade foram pessoas extremamente reservadas, racionais, conscientes de seu papel e seu tamanho diante do Universo; ou seja, quase nada. De forma que a genialidade é acompanhada da consciência do pouco que se pode atingir no todo, da imensidão de coisas, ideias e possibilidades que compõem o Universo, sendo ele, por mais brilhante que possa parecer, ainda ínfimo, diante de toda a Criação.
Assim, em uma mente cheia de si, ou entorpecida por preocupações mínimas, ou que é satisfeita por mimos sociais, coisas passageiras e insignificantes como prazeres momentâneos, realização de meros desejos carnais e coisas do tipo, não pode haver genialidade alguma; no máximo talento. A consciência criadora jamais o seria, se estivesse ocupada com pormenores, ou consigo mesma. Toda a criação é externa, para fora, para o outro.
Ademais, durante a longa estrada do conhecimento, da sabedoria e da prudência, qualquer indivíduo acaba por chegar no ponto de reflexão mais profunda, que o leva para os sentidos mais primitivos, para o contato com a natureza, para o questionamento sobre a origem, sobre coisas que já se tornaram por demasiado simples, mas que na verdade acabaram por dar lugar a outras que podem não parecer simples, mas certamente o são, simples e completamente desnecessárias para a completude do ser.
Uma mente sadia e bem alimentada não teme sua própria companhia; não necessita de subterfúgios para simular estados alterados de consciência, não busca a confusão, a balbúrdia, ou qualquer outro estago orgiástico; embora tenha condições plenas de se inserir nessas situações sem que sua essência ou componentes básicos sejam alterados. Mas quanto a isso, remeto ao início do post, ao dizer que a mente é como uma esponja que absorve indistintamente tudo que é colocado a seu alcance, sem filtrar o que é bom ou mal, desejável ou digno de repúdio, ela apenas absorve o que permitimos que esteja em seu contato. O caos total só não se apodera da maioria das mentes devido a barreiras morais e éticas latentes, ou convenções e repressões sociais que visam a proteção do eu, do ego e da reputação egoística, e não por falta de matéria negra por ela vagando.
Em suma, uma mente saudável é aquela que busca alimento puro, sadio, a ponto de ter sua essência alterada para o que é digno, louvável e honrado; por mais subjetivos que esses conceitos possam ser. A base espiritual ou filosófica de cada mente é o que os definem. Mas a perfidez do conteúdo que acompanha cada mínima influência trazida por um estilo de vida hedonista, utilitarista e egocêntrico que é quase que a lei atualmente, não pode ser ignorada de forma alguma, pois como pude perceber empiricamente, mente sadia ou espírito forte algum podem resistir ao constante ataque e distorção dos conceitos basilares do equilíbrio e da saúde mental.
Não sejamos como aqueles tantos que empenham sua vida, bem mais precioso, na construção de castelos de areia; que são levados por ondas, tendências passageiras, ou mesmo que fiquem ali intocados, serão certamente desmanchados pelo tempo, devido à fraqueza de sua fundação, e de seu material de construção. A vida é um dom por demais precioso para ser desperdiçada dessa forma.
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2 comentários:
"Serão os tempos atuais tão perversos a ponto de ter extirpado esse perfil do nosso meio, terá acontecido algum tipo de seleção natural às avessas, a ponto de que tenham permanecido somente pessoas pequenas, com aspirações igualmente medíocres e feitos ainda piores, como constantemente é noticiado para os quatro cantos? Não."
Gostei do seu texto. Depois de ler o seu blog compreendi o seu comentário no blog Reflexões Masculinas.
Certamente os indivíduos singulares que percorreram a história são os que ultrapassaram o pódium da mediocridade e talvez os únicos que podemos, sinceramente, chamar "indivíduos". Toda a massa amorfa, que encheu a história humana de existências entediantes, é ,provavelmente, hoje o signo do nosso tempo.
Acho que você vai gostar de um site que aborda especificamente o tema da mediocridade:
T.P.M. - Teoria e Prática da Mediocridade
www.guiatpm.wordpress.com
É exatamente esse o meu ponto de vista, Max... obrigado pela visita e já estou dando uma lida no blog que vc indicou; muito bom por sinal!
abraço
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