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domingo, 4 de outubro de 2015

Como ser fiel a si mesmo a seguir sua vocação


'Entre as várias inclinações possíveis que nos acometem, cada um de nós sempre encontra aquela que é a mais genuína e autêntica. A voz que o convoca para esse ser legítimo é o que denominamos “vocação”. Mas a maioria das pessoas se empenha em silenciar a voz da vocação e se recusa a ouvi-la. Conseguem gerar ruído dentro de si mesmas (...) distrair a própria atenção a fim de não ouvi-la; e se iludem ao substituir o eu genuíno por uma vida falsa.






Muitos dos grandes Mestres da história confessaram ter experimentado alguma espécie de força oculta, de voz interior ou de senso de destino que os impulsionava no rumo certo. Para Napoleão Bonaparte foi sua “estrela”, que ele sempre sentia ascender quando fazia o movimento certo. Para Sócrates, foi seu demônio, uma voz talvez de seres superiores, que falavam com ele em negativas – dizendo-lhe o que evitar. Goethe também a chamava de demônio – uma espécie de espírito que habitava dentro dele e o impelia a realizar seu destino. Em tempos mais modernos, Albert Einstein se referia a uma espécie de voz interior, que orientava o rumo de suas especulações. Todas essas manifestações são variantes do que Leonardo da Vinci experimentou com seu próprio senso de destino. Esses sentimentos podem ser vistos como puramente místicos, além de qualquer explicação, ou como alucinações ou delírios. Mas há outra forma de encará-los – como algo real, prático e explicável. É possível compreendê-los da seguinte maneira:


Todos nascemos como seres únicos. Essa singularidade é característica genética de nosso DNA. Somos fenômenos sem igual no Universo – nossa composição genética exata nunca ocorreu antes nem se repetirá jamais. Em todos nós, essa singularidade se expressa pela primeira vez na infância, por meio de certas inclinações primordiais. Para Leonardo, foi a exploração do mundo natural em torno de sua comuna, ao qual deu vida no papel, à sua maneira. Para outros, pode ser uma atração precoce por padrões visuais – não raro um indício de interesse futuro por matemática. Ou quem sabe um fascínio por movimentos físicos ou arranjos espaciais.


Como explicar essas inclinações? São forças dentro de nós que vêm de um lugar profundo incapaz de ser descrito por palavras conscientes. Elas nos atraem para certas experiências e nos afastam de outras. À medida que essas forças nos movimentam para lá e para cá, influenciam o desenvolvimento de nossa mente de maneira muito específica. Essa singularidade profunda naturalmente quer se afirmar e se expressar, mas algumas pessoas a experimentam de modo mais forte que outras. No caso dos Mestres, sua intensidade é tamanha que ela é percebida como uma realidade externa – uma força, uma voz, um destino. Nos momentos em que nos dedicamos a atividades que correspondem às nossas inclinações mais arraigadas, até sentimos um toque dessa realidade: as palavras que escrevemos ou os movimentos que executamos ocorrem com tanta rapidez e com tanta facilidade que até parecem se originar fora de nós. Estamos literalmente “inspirados”, palavra de origem latina que significa “soprar dentro”.


Podemos descrevê-la nos seguintes termos: ao nascermos, planta-se uma semente em nosso interior. Essa semente é a nossa singularidade. Ela quer crescer, transformar-se, florescer em todo o seu potencial, movida por uma energia assertiva natural. A sua Missão de Vida é cultivar essa semente até o pleno florescimento, é expressar sua singularidade por meio do trabalho. Você tem um destino a realizar. Quanto maior for a intensidade com que o sentir e o cultivar – como uma força, uma voz ou o que quer que seja –, maior será sua chance de realizar a sua Missão de Vida e alcançar a maestria.


O que atenua essa força, o que faz com que você não a sinta ou mesmo duvide de sua existência, é a extensão em que sucumbe a outra força da vida – as pressões sociais para o conformismo. Essa contraforça pode ser muito poderosa. Você quer se encaixar em um grupo. Inconscientemente, talvez sinta que o que o distingue dos demais é algo embaraçoso ou doloroso. Seus pais muitas vezes também atuam como contraforça. Pode ser que tentem direcioná-lo para uma carreira lucrativa e segura. Se essas contraforças se tornam poderosas demais, você perde qualquer contato com sua singularidade, com quem você realmente é. Suas inclinações e seus desejos passam a se moldar em outras pessoas.


Essa situação pode lançá-lo em terreno muito perigoso. Você acaba escolhendo uma carreira que não é compatível com sua personalidade. Seus desejos e interesses aos poucos se desvanecem e seu trabalho sofre as consequências. Você passa a procurar prazer e realização fora do trabalho. Ao se desengajar cada vez mais da carreira, deixa de prestar atenção nas mudanças dentro de sua área de atuação – fica para trás e paga por isso. No momento de tomar decisões importantes, você se esconde ou segue o exemplo dos outros, pois não tem senso de direção nem uma bússola interior que o oriente. Perdeu o contato consigo mesmo. Você precisa evitar esse destino a todo custo. O processo de seguir a sua Missão de Vida que o leva à maestria pode ser iniciado a qualquer momento. A força oculta está sempre presente dentro de você, pronta para entrar em ação.


O processo de realizar a sua Missão de Vida se desenvolve em três estágios. Primeiro, você precisa se ligar ou religar com suas inclinações, com aquele senso de singularidade. Portanto, o primeiro passo é sempre introspectivo. Você vasculha o passado em busca de indícios daquela voz ou força interior. Silencia as outras vozes que podem confundi-lo – como as de pais e amigos. Procura um padrão subjacente, o âmago de seu caráter, que você deve compreender da forma mais profunda possível.


Segundo, com o restabelecimento da conexão, você deve examinar a carreira em que já está ou que está prestes a iniciar. A escolha desse caminho – ou seu redirecionamento – é fundamental. Nesse estágio, é preciso ampliar seu conceito de trabalho. Com muita frequência, estabelecemos uma distinção entre vida profissional e vida pessoal, sendo que só nesta última encontramos prazer e realização. O trabalho geralmente é visto como um meio de ganharmos dinheiro para aproveitar a vida fora dele. Mesmo que encontremos alguma satisfação em nossa carreira profissional, ainda tendemos a compartimentar a vida dessa maneira. Essa é uma atitude deprimente, pois, afinal, passamos no trabalho uma parcela substancial das horas em que estamos acordados. Se encararmos a vida profissional como uma provação a ser enfrentada para alcançarmos as verdadeiras fontes de prazer, as horas despendidas no trabalho representarão um trágico desperdício de nossa curta existência. Em vez disso, é desejável ver o trabalho como algo mais inspirador, como parte de sua vocação. A palavra “vocação” vem do latim e significa chamado ou convocação. Seu uso em relação ao trabalho coincidiu com o início do Cristianismo – certas pessoas eram “convocadas” por Deus a abraçar a vida religiosa; essa era sua vocação. Os primeiros cristãos seriam capazes de “ouvir” literalmente sua vocação, ao escutarem o chamado de Deus, que os escolhera para esse trabalho de salvação. Com o passar do tempo, o termo se secularizou, passando a se referir a qualquer trabalho ou estudo que alguém sentia ser compatível com sua personalidade. No entanto, é hora de retornarmos ao sentido original do termo, pois ele se aproxima muito mais da ideia de Missão de Vida e de maestria.


Essa voz que o convoca vem de um lugar profundo da alma. Ela emana de sua individualidade.  Indica quais atividades são mais compatíveis com seus interesses. E, a certa altura,  ela o chama para um tipo especial de trabalho ou carreira. Nesse caso, o trabalho passa  a ser algo profundamente conectado com o seu ser, não um compartimento isolado.  É assim que se desenvolve o senso de vocação.


Você deve encarar sua carreira ou caminho vocacional mais como uma jornada, com suas curvas e desvios, do que como uma linha reta. Você começa escolhendo uma área ou posição que corresponda mais ou menos às suas inclinações. Esse ponto de partida lhe oferece espaço para manobra e indica importantes habilidades a serem aprendidas. Não se pode começar com algo muito grandioso e ambicioso – você precisa ganhar a vida e conquistar confiança. Uma vez nesse caminho, você encontra certas trilhas internas que o atraem, enquanto outras o desagradam. Ajusta o curso e talvez se movimente para outra área assm, mas sempre expandindo sua base de qualificações. Como Leonardo, você parte do que faz para os outros e o converte em algo próprio.


No final, descobre determinada área, nicho ou oportunidade que se encaixa perfeitamente com suas inclinações. Você o reconhecerá tão logo o encontre, pois ele irá disparar aquele senso infantil de deslumbramento e empolgação. Depois disso, tudo se encaixará. Você aprenderá com mais rapidez e mais profundidade. Seu nível de habilidade chegará a um ponto em que você será capaz de reivindicar sua independência no ambiente de trabalho e tomar seu próprio rumo. Em um mundo em que não há tantas coisas que não conseguimos controlar, essa condição lhe proporcionará o máximo de poder. Você determinará suas circunstâncias. Como seu próprio Mestre, não mais estará sujeito aos caprichos de chefes tirânicos ou de colegas manipuladores.


Essa ênfase em sua singularidade e em sua Missão de Vida talvez pareça um conceito poético, sem qualquer relação com a realidade prática, mas, na verdade, ela é bastante relevante para os tempos em que vivemos. Estamos entrando numa era em que podemos confiar cada vez menos no Estado, nas empresas, na família ou nos amigos como fontes de ajuda e de proteção. É um ambiente globalizado, altamente competitivo. Precisamos aprender a nos desenvolver. Ao mesmo tempo, é um mundo apinhado de problemas graves e de oportunidades promissoras, que serão mais bem resolvidos e aproveitados pelos empreendedores – indivíduos ou pequenos grupos que pensam de forma independente, se adaptam com rapidez e possuem pontos de vista únicos. Suas habilidades criativas sem igual serão muito valorizadas.


Pense nisso da seguinte maneira: no mundo moderno, o que mais falta em nossa vida é o senso de um propósito mais amplo. No passado, eram as religiões organizadas que ofereciam esse sentimento. No entanto, hoje quase todos vivemos em um mundo secularizado. Nós, seres humanos, somos únicos, e portanto devemos construir nosso próprio mundo. Não reagimos simplesmente aos acontecimentos por algum código biológico. Porém, sem o senso de direção, ficamos confusos. Não sabemos preencher e estruturar nosso tempo. Parece que não dispomos de um propósito na vida. Talvez nem mesmo tenhamos consciência de nosso vazio, mas ele nos contamina de todas as maneiras.


Sentir que somos convocados a realizar algo é a forma mais positiva de alcançarmos esse senso de propósito e de direção. É como uma busca religiosa para cada um de nós. Essa procura não deve ser vista como egoísta ou antissocial. Ela, de fato, se relaciona com algo muito maior que a vida de cada um. Nossa evolução como espécie dependeu da criação de uma grande diversidade de habilidades e de pontos de vista. Prosperamos com base na atividade conjunta de pessoas dotadas de talentos singulares. Sem essa diversidade, a cultura morre.


A singularidade de cada um ao nascer é o fator fundamental dessa diversidade indispensável. Na medida em que ela é cultivada e expressada, um papel fundamental é exercido. Nossos tempos enfatizam a igualdade, o que pode ser confundido com a necessidade de todos serem idênticos. No entanto, essa igualdade na verdade oferece a todos as mesmas oportunidades para expressar suas diferenças, permite o florescimento da
biodiversidade. A vocação é mais que um trabalho a executar. É algo que se relaciona com a parte mais profunda do ser e que é manifestação da enorme diversidade na natureza e na cultura humana.

                                

Cerca de 2.600 anos atrás, Píndaro, poeta da Grécia Antiga, escreveu: “Torna-te quem és aprendendo quem és.” O que ele queria dizer com isso é o seguinte: você nasceu com determinada compleição e com certas tendências que o caracterizam. Algumas pessoas nunca se tornam quem são em seu âmago; param de confiar em si mesmas, sujeitam-se às preferências alheias e acabam usando uma máscara que oculta sua verdadeira natureza. Se você criar condições para descobrir quem realmente é, prestando atenção na voz e na força em seu interior, poderá realizar o seu destino – tornando-se um indivíduo, um Mestre.'

Robert Greene - Mastery

terça-feira, 1 de setembro de 2015

A mais elevada Vocação Humana




Raissa Maritain nasceu em 1883, na Rússia. Aos dois anos sua família mudou-se para Mariupol, na Criméia. Com 10 anos seus pais emigraram para Paris e aí, desde cedo, manifestou especial inclinação para o estudo. Aos dezessete anos ingressou na Sorbonne.




Este é o relato que ela nos deixou sobre o que encontrou nesta que era em sua época a mais famosa Universidade do mundo:



"Dezessete anos, diz Raissa, apenas dezessete anos, e as mais profundas exigências do espírito e da alma já se fazem ouvir! Toda uma vida já foi vivida, a da infância, a da confiança ilimitada. Agora, eis a adolescência, com seu cunho próprio: uma exigência total

.

Se os professores se lembrassem um pouco de sua própria alma de adolescentes, como tremeriam diante da ingenuidade dos que vêm a eles com a confiança ainda de uma criança, mas já com os direitos de um juiz justo!



Mas os professores de meu tempo, por melhores, dedicados e competentes que fossem, de geração em geração tinham se afastado cada vez mais das grandes exigências do espírito humano. O brilhante desenvolvimento das ciências da natureza e as esperanças infinitas que havia despertado, os levaram a desprezar os outros conhecimentos, em particular a esta sabedoria pela qual aspiramos antes, depois e acima de qualquer conhecimento das ciências particulares. Assim era a Sorbonne no começo de nosso século nos anos que precederam a guerra de 1914.



Quando nela ingressei, preocupei-me apenas em encontrar estes professores dos quais esperava que, sem que eu os interrogasse, fossem responder às minhas perguntas, dar-me uma visão ordenada do Universo, por todas as coisas no seu verdadeiro lugar. Depois de tudo isso saberia, eu também, qual é o meu lugar nesse mundo e se poderia ou não aceitar a vida que não escolhi e que me pesava.



O que me movia não era a curiosidade, não estava ávida de saber uma coisa qualquer, ainda menos de saber tudo; não estava perturbada pelas descobertas da ciência, no momento estas me deixavam bem indiferente, como algo de excedente mas que não me afetava diretamente. Não, eu só procurava verdadeiramente aquilo de que precisava para justificar a existência, aquilo que me parecia, a mim, necessário para que a vida humana não fosse uma coisa absurda. Tinha necessidade da alegria da inteligência, da luz da certeza, de uma regra de vida fundada sobre uma verdade sem falhas.



Com semelhantes disposições, evidentemente, eu deveria terme dirigido primeiramente aos filósofos. Mas ninguém me tinha orientado, e eu acreditava então que as ciências da natureza eram a chave de todo o conhecimento. Inscrevi-me, portanto, na Faculdade de Ciências. Nenhuma das minhas interrogações foi tratada pelos sábios eminentes que nos ensinavam a estrutura do Universo Físico. Aqueles que amavam o estudo tranqüilo da natureza eram observadores admiráveis. Mas, quanto a mim, preocupava-me com essa mesma natureza, mas queria conhecê-la de outra maneira, nas suas causas, na sua essência, na sua finalidade. Um dia aventurei-me a dizer isso ao professor e ele me respondeu indignado:



`Mas isso é mística!'



Desde então ouvi esta fórmula de escândalo muitas vezes na Sorbonne. Era com ela que costumavam condenar qualquer atividade da inteligência que procurava se elevar acima da simples verificação empírica dos fatos. Mas para mim foi a primeira ferida, o primeiro golpe no meu espírito, na confiança que depunha nos meus professores. Tive que aprender que os sábios pouco estimam os supremos princípios da inteligência, ou pelo menos não parecem preocupar-se muito com eles. Os valores puramente especulativos os interessam bem pouco, e as matemáticas são o seu mais alto céu inteligível. Os sábios, quando não filosofavam, se limitavam em geral ao simples bom senso empírico. Os que filosofavam e que conheci na Sorbonne eram, quando muito, partidários de doutrinas que negavam a objetividade de todo saber que ultrapassasse o conhecimento dos fenômenos sensíveis. Perguntava-me como os notáveis homens de ciência, cujos cursos eu seguia, ou aqueles cujos livros eu lia, podiam permanecer tranqüilamente num estado de espírito tão vago e tão confuso, sem preocupação alguma. Decepcionada com os estudiosos das ciências da natureza, Raissa nos conta que passou então a freqüentar os cursos dos professores que se dedicavam à filosofia:


Os filósofos cujos cursos passei a seguir na Faculdade de Letras tinham muitos méritos, possuíam erudição ampla e profunda, e uma alta consciência das exigências da investigação científica. Mas toda a sua inclinação era para a erudição histórica; consideravam as doutrinas não como proposições ou aproximações da verdade, mas como obras de arte ou de imaginação, tendo até menos referência com a realidade do que a arte, reduzindo seu estudo a um desfile caleidoscópico em que a forma nova destruía a anterior. Entregavam-se à análise sem fim das particularidades das causas históricas das doutrinas filosóficas como se esta fosse a tarefa que lhes cabesse de modo essencial. Por uma estranha contradição vivida, queriam verificar tudo e ao mesmo tempo desesperavam da verdade, cujo simples nome lhes desagradava e que não devia ser pronunciada senão entre as aspas de um sorriso desiludido. A única lição prática que pude receber daquele ensino tão consciencioso e desinteressado foi uma lição de relativismo integral.



Finalmente, fiz um balanço de tudo o que me tinham trazido  aqueles anos de estudo na Sorbonne. Não queria saber mais de uma tal comédia. Eu seria capaz de aceitar uma vida dolorosa, mas não uma vida absurda. Eu queria saber se ser é um acidente, um benefício ou uma desgraça. Se a natureza humana era tão infeliz que não chegava a possuir senão uma pseudo inteligência, capaz de tudo menos da verdade, se ela, ao julgar-se a si mesma, devia humilhar-se até esse ponto, não se podia mais nem pensar nem agir dignamente. Tinha pensado durante muito tempo que ainda valia a pena lutar pelos pobres, mas agora eu via que se não houvesse no mundo um só coração que padecesse certos sofrimentos, mesmo que não houvesse no mundo um só corpo que não conhecesse a morte, ainda assim isso exigiria uma satisfação."



Este é o testemunho de Raissa sobre o que ela encontrou na Universidade de Paris no início do século XX. Isto que ela ali buscava, algo que estava inteiramente fora das cogitações por parte dos professores daquela Universidade, isto mesmo entretanto tinha sido o objetivo perseguido pelos professores daquela mesma Universidade quando lá ensinavam nos séculos XII e XIII Hugo de São Vitor e Santo Tomás de Aquino. Raissa tinha se dirigido ao lugar certo, mas com sete séculos de atraso.



Que são, porém, suas palavras, senão um testemunho vivo de nosso século XX de que a contemplação não é um fenômeno cultural restrito a tal ou qual civilização, mas uma aspiração profunda da natureza humana; algo, no dizer de Raissa,


"a que aspiramos antes, depois e acima de qualquer 
conhecimento das ciências particulares?"

E de cujas palavras se deduz ser também o fim último da educação, pois não foi senão à Instituição que era o vértice do sistema educacional do mundo da época que Raissa se dirigiu como ao lugar mais óbvio quando quis satisfazer a esta mesma aspiração.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

A Beleza da Vida Contemplativa

"Vamos fazer algumas considerações no
sentido de mostrar que tipos de desafio pode a inteligência encontrar já na simples
contemplação da natureza. Se não se é capaz de perceber isto de imediato, apesar de
estarmos mergulhados na natureza o tempo todo, é apenas porque estamos habitualmente
preocupados com insignificantes problemas do dia-a-dia que desviam toda a atenção de
nossa inteligência do espetáculo extraordinário que nos circunda.
Para tentarmos compreender o alcance desta afirmação, vamos considerar o
ato mais trivial de qualquer estudante, o ato de vir à escola. Consideremos, ademais, um
estudante habitualmente preocupado, um estudante de escola noturna.
Antes de vir à escola, para retemperarmos nossas forças e não sentir o
incômodo de assistir à aula com fome, jantamos em nossas casas.Este simples ato já é por
si um verdadeiro espetáculo.

Para tomarmos o alimento, a natureza teve que elaborar um sistema
digestivo bastante complexo para ser capaz de digerir precisamente aqueles mesmos
alimentos que ela própria, por outro lado, oferece a todos abundantemente.
Recolher estes alimentos esparsos pelo mundo para produzir uma simples
janta seria uma tarefa penosíssima. Mas tudo isto, naquele momento, já tinha sido
resolvido. Centenas de pessoas haviam estudado agricultura, haviam plantado nos lugares
mais diversos cada um dos alimentos que iriam ser utilizados em nossa janta, outra
multidão os colheu, centenas de homens os transportaram, outros os conservaram, e outros,
finalmente, se especializaram em saber distribuí-los e vendê-los, deixando-os localizados
em lugares de fácil acesso para que nós os adquiríssemos.

Assim, naquele momento, um mundo imenso de pessoas na verdade estava
se preocupando conosco, e a própria natureza também, que sabiamente preparava as chuvas
para a lavoura e fornecia ao nosso corpo as enzimas necessárias à digestão justamente
daqueles alimentos que ela própria produzia.
Nós, porém, ali sentados, não prestamos atenção a nada disso. Só
queríamos sair correndo para não chegar atrasados à escola.
Quando saímos de casa, porém, outro espetáculo não menos fantástico
estava preparado.

Alguém tinha construído um elevador para nosso uso, e o tinha instalado
exatamente no lugar onde era necessário para nosso pronto e imediato transporte. Para que
o elevador estivesse ali, quantas pessoas não tinham trabalhado! Quanto carvão não teve
que ser usado para produzir seu aço, quanta madeira não teve que ser plantada para
construir suas portas, quantos operários e engenheiros não reelaboraram este aço e esta
madeira para transformá-la em um elevador; quantos outros operários e engenheiros não
tiveram que prever na planta do edifício todo o trabalho dos colegas que fabricavam o
elevador. Mas depois, alguém continuava bombeando ininterruptamente energia elétrica de
muito longe para que ele funcionasse com apenas um toque de nosso dedo; e para que este
alguém pudesse fazer isto, milhares de outros homens tiveram que represar um rio e criar
um lago artificial, para fazer o que, ademais, tiveram antes que criar uma cidade operária
nas proximidades do campo de obras da represa!
A rua, ademais, estava calçada. Outras pessoas, sabe-se lá quantas, tinham
se preocupado com isto também. A rua estava calçada, e estava também asfaltada, para
fazer com que um ônibus pudesse trafegar para nossa comodidade. Sem que o pedíssemos,
não apenas um ônibus, mas os mais diversos ônibus passavam regularmente à nossa
disposição para nos levar não a um só lugar, mas a qualquer lugar que quiséssemos. Para
isto milhares de pessoas tiveram que estudar mecânica, projetar os ônibus, construir os
ônibus, vender os ônibus, fazer a manutenção dos ônibus, dirigir os ônibus, explorar
petróleo, refinar petróleo, transportar gasolina, educar motoristas, educar o trânsito,
sinalizar o trânsito, e não só tinham feito tudo isso como o continuavam fazendo
incessantemente para que pudéssemos tomar o ônibus naquele momento ou a qualquer
momento.

Naquele momento o Sol se punha. O Sol também fazia parte do espetáculo.
Fazia séculos que o Sol brilhava todos os dias, e por causa disso é que podíamos enxergar
todas as coisas, mas o que é incrível, porém, é que nós não percebemos ou pensamos nisto
um só momento.

Estávamos preocupados, como sempre, com um insignificante problema
pessoal, infinitamente menor do que tudo isso, teoricamente muito menos capaz de chamar
a atenção de qualquer ser inteligente por mais obtuso que fosse, mas que na verdade era
exatamente o que estava conseguindo tirar toda a nossa atenção daquele espetáculo
fantástico: o temor de um atraso pessoal de alguns minutos.
Como é possível que uma coisa tão minúscula e tão insignificante impeça
para a maioria das pessoas a percepção de uma coisa destas? Pois se é compreensível que
todos tenham o seu momento patológico na vida, o fato é que, quando lecionamos e
falamos destas coisas em salas de aula onde há alunos se preparando para o Magistério,
vários dos quais contando com mais de trinta anos de idade, percebemos que era, na
verdade, a primeira vez em todas as suas vidas que se davam conta do espetáculo de que
falava Pitágoras.

Mas, chegando à escola, não paramos para perceber também que não
estávamos chegando sozinhos a esta nobre instituição. Para que pudéssemos aprender
alguma coisa, todo este aparato fenomenal que nos permitiu chegar à escola foi igualmente
mobilizado para trazer dos lugares mais diversos dezenas ou centenas de outras pessoas
para fazerem funcionar a escola normalmente enquanto pudéssemos estudar
tranqüilamente. O nosso pequeno objetivo de nos dirigirmos à escola assim encontrava
resposta em um aparato de escala mundial, mas nem nós, nem nenhum dos funcionários da
escola pensavam nisto. Nós estávamos preocupados com o atraso; os funcionários com o
salário que iam receber no fim do mês.
Como nós não observávamos o que acontecia à nossa volta, subimos as
escadas correndo. Encontramos então não apenas um corpo de funcionários, mas também
um corpo de professores que estavam sendo preparados desde a sua infância, recrutados
das mais diversas cidades e educados por milhares de outros professores para que
pudessem acumular um vasto conhecimento e tudo isto, enfim, para dar uma aula de 50
minutos às 20:00 horas.

Como é possível que um tão vasto complexo de forças naturais, das quais
esta discussão é apenas uma insignificante fração, pudesse estar tão adequadamente
ajustada para um objetivo tão pequeno? E que fêz aquele aluno em toda a sua vida para
merecer semelhante coisa em troca? Como se não bastasse, fazia mais de trinta anos que
ele nem sequer se dava conta de tudo isto, e iria passar mais outros quarenta e morrer
assim, reclamando da imensidão de seus problemas, se não despertasse, só por alguns
minutos, apenas durante aquela aula.






Quem não é capaz de entrever a admirável beleza que existe por detrás de tudo isto, e o inexplicável sono em que vivemos no nosso quotidiano?"

-A Educação Segundo a Filosofia Perene

sexta-feira, 27 de junho de 2014

A Crise do Mundo Moderno

É sempre bom um pouco de perspectiva para entendermos, ainda que superficialmente as condições sob as quais vivemos. Quanto mais se olha para trás e para cima, melhor será a percepção dos parâmetros pelos quais pautamos desde nosso valores mais profundos, até nossas mais frívolas opiniões. É nesse sentido que a filosofia perene nos coloca diante de um holofote, para que assim percebamos em quão grandes trevas andamos às apalpadelas, ainda que acreditando testemunhar a época de maior clarividência e no ápice da sabedoria e conhecimento.

- A Crise do Mundo Moderno


A palavra "filosofia", em si mesma pode seguramente ser tomada em um sentido muito legítimo, que sem dúvida foi o seu primitivo sentido, sobretudo, se for verdade, como pretendem, que foi Pitágoras quem a empregou antes de qualquer outra pessoa: etimologicamente ela não significa senão "amor à sabedoria"; designa portanto, em primeiro lugar, uma prévia disposição requerida para ascender à sabedoria, mas também pode designar, por uma extensão muito natural, a procura que, provindo desta mesma disposição, deve conduzir ao conhecimento. Não é pois senão um estágio preliminar o preparatório de um encaminhamento que conduz à sabedoria, mas que nem por isso deixa de estar abaixo dela. O descaminho que se produziu posteriormente consistiu em tomar este grau transitório pelo próprio fim, tem pretender substituir pela sabedoria a "filosofia", o que implica na falta de lembrança ou o desconhecimento da verdadeira natureza da primeira. E foi assim que nasceu o que poderemos chamar a filosofia "profana", isto é, uma pretensa sabedoria puramente humana e por conseguinte de ordem simplesmente racional, tomando o lugar da verdadeira sabedoria tradicional, supra-racional e "não humana". 


É este o resultado em que culminaria o movimento começado pelos gregos, em que já se afirmavam as tendências que seriam em nossos dias levadas às conseqüências mais extremas. A excessiva importância que deram ao pensamento racional, acentuou-se ainda mais, chegando ao "racionalismo", atitude especialmente moderna que consiste, não mais em só e simplesmente ignorar mas em negar expressamente tudo quanto seja de ordem supra-racional.

Já foram também várias vezes assinalados certos traços comuns entre a decadência antiga e a época atual; e sem querer levar muito avante o paralelismo, devemos, efetivamente, reconhecer nele várias semelhanças notáveis. A filosofia puramente "profana" tinha ganho terreno; o aparecimento do cepticismo de um lado, o sucesso do "moralismo" estóico e epicurista do outro, mostram bastante até que ponto a intelectualidade desceu. Ao mesmo tempo as antigas doutrinas sagradas, que quase mais ninguém compreendia, tinham degenerado, devido a esta incompreensão, ao "paganismo", no verdadeiro sentido do termo, isto é, não passavam de "superstições", coisas que, tendo perdido sua profunda significação, sobrevivem a si mesmas por manifestações unicamente exteriores.



O acelerado declínio de uma civilização pode ser exposto pela 
degeneração de seu  senso estético, aversão à justiça, e à moral. 
As noções de arte ilustram bem esse aspecto.


A verdadeira Idade Média, para nós, estende-se desde o reinado de Carlos Magno até os princípios do século XIV. Com esta última data começa uma mova decadência, que através de etapas diversas, se foi acentuando até nossos dias. E o verdadeiro ponto de partida da crise moderna é o começo da desagregação da "cristandade", com a qual se identificava essencialmente a civilização medieval no Ocidente. Ao mesmo tempo, o fim do regime feudal, assaz intimamente ligado e solidário com esta mesma "cristandade", é a origem da constituição das "nacionalidades". Portanto, é preciso considerar o começo dos tempos modernos dois séculos mais cedo do que se leva em conta habitualmente.

Quanto às ciências tradicionais da idade média, depois de terem apresentado ainda algumas manifestações finais, inerentes a esta época, desapareceram tão radicalmente como as das civilizações mais remotas que foram outrora aniquiladas por algum cataclismo; desta vez, porém, nada haveria para substitui-las. Daí por diante nada mais houve além da filosofia e da ciência "profanas", isto é, a negação da verdadeira intelectualidade, a limitação do conhecimento à ordem mais inferior, o estudo empírico e analítico dos fatos que não estão mais ligados a qualquer princípio, a dispersão numa multidão indefinida de detalhes insignificantes, o acúmulo de hipóteses sem fundamentos, que se destróem incessantemente umas às outras, e vistas fragmentárias que a nada podem conduzir, salvo a essas aplicações práticas que constituem a única superioridade efetiva da civilização moderna; superioridade aliás pouco invejável, e que desenvolvendo-se até abafar qualquer outra preocupação deu à esta civilização o caráter puramente material que a tornou uma verdadeira monstruosidade.

Há uma palavra que ocupou um lugar de honra na Renascença, e que resumia antecipadamente todo o programa da civilização moderna: o "humanismo". Tratava-se, com efeito, de reduzir tudo a proporções puramente humanas; prescindir de qualquer princípio de ordem superior, e poder-se-ia dizer simbolicamente desviar-se do céu sob o pretexto de conquistar a terra.

O "humanismo" já era uma primeira forma daquilo em que se transformaria o "laicismo" contemporâneo; e querendo reduzir tudo à medida do homem, tomado como fim, a si próprio, acabou êle por descer de etapa  em etapa ao seu mais baixo nível, e para só quase procurar a satisfação das necessidades inerentes ao lado material de sua natureza, pretensão afinal de contas bastante ilusória, pois que esta suscita sempre mais necessidades artificiais dia que as poderia satisfazer.

Irá o mundo moderno até o fim deste fatal declive, ou então, como aconteceu na decadência do mundo greco-latino, uma nova correção se produzirá, e ainda desta vez antes que tenha atingido o fundo do abismo para onde está sendo arrastado? Mas parece provável que uma parada a meio caminho não seja mais possível. Segundo todas as indicações fornecidas pelas doutrinas tradicionais, nós já entramos decididamente na fase final da Kali Yuga, no período mais sombrio desta "idade sombria", e deste estado de dissolução não é mais possível sair senão por um cataclismo, pois neste caso não bastará
uma simples retificação — será necessário uma renovação total. A desordem e a confusão imperam em todos os campos, foram levadas a um ponto que ultrapassa muito e muito tudo quanto se havia visto precedententente, e partindo do Ocidente, ameaçam agora invadir o mundo inteiro.




Efetivamente é mesmo isso o que nós podemos constatar na civilização moderna, que não vive por assim dizer, senão daquilo que as civilizações anteriores desdenharam. Para o evidenciar, basta ver de que modo os representantes das civilizações que se puderam ainda manter, até agora no mundo oriental, apreciam as ciências ociden tais e suas aplicações industriais. Entretanto estes conhecimentos inferiores, tão vazios aos olhos de quem possui um conhecimento de outra ordem, deviam ser "realizados", e para isso seria preciso que se encontrassem numa fase em que a verdadeira intelectualidade tivesse desaparecido.

É esse o caso de tôdas as civilizações a que podemos chamar normais, ou ainda tradicionais; não há entre elas nenhuma oposição essencial, e as divergências, quando existam são apenas exteriores e superficiais; uma civilização que não reconheça princípio algum superior, que só seja na realidade fundada sobre uma negação de princípios, é ipso-facto desprovida de todo o meio de entendimento com as outras, pois este entendimento para ser verdadeiramente profundo e eficaz, só pode estabelecer-se pelo alto, quer dizer, precisamente pelo que falta a esta civilização anormal e que perdeu sua rota. No presente estado do mundo, temos por conseguinte, de um lado todas as civilizações que permaneceram fiéis ao espírito tradicional, que são as  civilizações orientais, e de outro lado uma civilização propriamente antitradicional que é a civilização ocidental moderna.

Excertos do primeiro capítulo da obra homônima de René Guénon. 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Filosofia Prática para Leigos

- A Filosofia é aplicável à vida?


Essa é uma questão que muitos tendem a responder negativamente; relacionam filosofia apenas a teoria, especulação, ideias, tudo que sozinho não pode produzir frutos na vida prática (lembrando que ao contrário do que a sociedade materialista apregoa, o campo da prática não está restrito a práticas sensoriais e físicas). A realidade é que essa noção não poderia estar mais equivocada. Vejamos:

'Entre as numerosas perguntas que, sem cessar, me são feitas sobre os cursos de Filosofia que leio e os livros que escrevo, essa é a mais frequente. Todos querem saber se a Filosofia tem qualquer relação com a vida humana, ou se é apenas uma teoria abstrata, para horas de ócio e lazer.

Por detrás dessa pergunta está latente a ignorância ou o erro que os consulentes nutrem a respeito de Filosofia. Para mim, teoria que não tenha nexo com a vida humana não é Filosofia. O fim primário da verdadeira Filosofia, é precisamente este: dar ao homem uma norma de vida, firme e indestrutível, um roteiro seguro de pensar e agir, de maneira que possa atingir a plenitude da sua evolução e, destarte, alcançar imperturbável felicidade.

As religiões, é verdade, também procuram realizar esse objetivo; mas as normas que elas dão a seus adeptos têm de ser criadas e aceitas cegamente como dogmas fixos e imutáveis - ao passo que a Filosofia leva os seus discípulos a compreenderem racionalmente, por experiência própria, a última razão-de-ser dessas normas; não exige fé teológica, mas prepara os caminhos para que o candidato à suprema sabedoria (sophia) possa, finalmente transpor o limiar do santuário e entrar em contato direto com o mundo invisível, que rege todos os mundos visíveis e, sobretudo, a vida humana. Sendo que este mundo invisível é o único mundo plenamente real, segue-se que só o homem que realiza a si mesmo pelo descobrimento do seu Eu central é que pode conhecer por experiência própria esse mundo da Realidade integral.

O cultor de dogmas religiosos é um crente - o iniciado na verdade da Filosofia é um sapiente.
É natural que o número dos crente seja maior, no estágio atual da evolução humana, do que o dos sapientes, porque o crer é relativamente fácil, ao passo que o saber exige uma disciplina tão intensa e prolongada que são poucos os que trilham esse "caminho estreito" e passam por essa "porta apertada", que dá ingresso ao Reino de Deus, da verdade e da felicidade.




                                                            * * *

Entretanto, o que a maior parte dos consulentes deseja saber, quando pergunta se a Filosofia é aplicável à vida prática, é o seguinte: sendo que todo homem adulto tem os seus dolorosos problemas, estão todos interessados em descobrir uma fórmula segura e de fácil aplicação que lhes garanta solução desde ou daquele problema da sua vida. Uns são infelizes nos seus amores; outros não tem sorte nos negócios; muitos são vítimas de doenças que lhes amarguram a vida - e assim por diante. É natural que cada um desses sofredores espere da Filosofia solução ou alívio nos seus dissabores.
Pode a Filosofia melhorar a vida humana, aqui na terra?
Pode, sim, ou melhor, a Filosofia, assim como nós a entendemos, é o único meio certo e seguro para encher de sólida tranquilidade e paz a alma e a vida do homem que com ela se identifique. Entretanto, são relativamente poucos os que experimentam esses efeitos benéficos da Filosofia Perene. Por quê?

Muitos esperam da Filosofia efeitos imediatos, mais ou menos como o efeito de um comprimido que, dissolvido na água, dentro de poucos minutos acaba com a dor de cabeça ou neutraliza a azia de estômago; ou como uma injeção que dá alívio rápido ao padecente.
Não é deste modo que a Filosofia atua sobre a vida humana, e isto por uma razão muito simples: é que ela, precisamente por ser "filosofia" (amor à sabedoria), não está interessada em curar sintomas de males, mas o próprio mal pela raiz. Como, porém, o mal fundamental da humanidade vem de longe e tem raízes profundas em cada ego pessoal, não é possível neutralizar esse mal em "três meses, com 36 lições", como certos faquires mentais prometem a seus ignorantes e ingênuos discípulos. A verdade atua segura, mas lentamente, porque tem de penetrar profundamente todos os elementos que constituem o homem: alma, mente e corpo; tem de eliminar as velhas e inveteradas toxinas da personalidade e substituí-las pelas seivas vitais da individualidade cósmica do homem perfeito e integral. Também, como poderia alguém esperar que os venenos da consciência físico-mental, eivada de egoísmo, fossem depurados em tão pouco tempo, quando a sua formação na personalidade humana remonta a 30, 50, 80 anos, e sua origem no seio do gênero humano data de milhões de anos?

O que a maior parte quer saber é se a Filosofia exerce impacto sobre a "vida prática", individual e social do homem; se dá saúde, se promove os negócios, se facilita a conquista de um bom emprego, se constrói um lar feliz, se facilita os estudos e os exames, etc., etc.
Respondemos com um afoito "sim" a todos esses quesitos, e isto sem o menor receio de errarmos, porque, além de milhares de fatos históricos, temos a nosso favor o testemunho da mais alta autoridade no assunto, o homem mais feliz do mundo, que disse: "Procurai em primeiro lugar o reino de Deus e sua justiça, e todas as outras coisas vos serão dadas de acréscimo".
Todas essas "outras coisas" que nos serão dadas de acréscimo são as que acabamos de enumerar, e muitas outras.


A Filosofia trata daquilo que o homem é, da sua qualidade interna, do seu sujeito ou Eu, que Jesus chama "alma"; mas é um dos erros comuns e funestos supor que o elemento espiritual da qualidade deva substituir os elementos materiais da quantidade, os objetos externos, aquilo que o homem tem ou pode ter. Os grandes iluminados não falam em substituição, falam em integração das quantidades externas na qualidade interna. Se por vezes parece haver substituição das quantidades materiais pela quantidade espiritual, trata-se de uma fase de transição, de algo provisório, para que o homem materialista por meio do caminho da espiritualidade ascética, se habitue a ser homem espiritual e perfeitamente integrado no Universo de Deus.
Nesta altura, prevenimos insistentemente todos os candidatos inexperientes à auto-realização: que o "reino de Deus" deve ser procurado, em primeiro lugar, isto é, que o homem não deve, em hipótese alguma, servir-se das coisas espirituais como meio para o fim de alcançar as coisas materiais, porque isto seria procurar estas em primeiro lugar, como fim último, e degradar aquelas a segundo lugar, como simples meio. Semelhante procedimento seria uma inversão das eternas leis da Constituição Cósmica, erro que impediria que as "outras coisas" nos fossem dadas de acréscimo.

E é precisamente aqui que está o ponto nevrálgico e a última razão por que a maior parte dos aspirantes ao reino de Deus se sentem desiludidos e frustrados no seu intento e acabam por considerar a Filosofia como simples miragem. Secretamente, fazem consigo mesmos este cálculo ou raciocínio: tratarei das coisas espirituais, a fim de ter sorte nos afazeres materiais.

Sobre esta base falsa, anticósmica, pretendem então construir o edifício da sua prosperidade e ficam decepcionados quando as "outras coisas" que lhes foram prometidas como resultados certos, não aparecem. Culpam então, a Filosofia dos grandes Mestres - quando, na realidade, os únicos culpados são eles mesmos. Tentaram camuflar ou subornar a Constituição Cósmica; tentaram derrubar com a cabeça o Himalaia da eterna retitude.

A atitude correta que o homem deve assumir é esta: tratar das coisas do "reino de Deus" incondicionalmente, sem segundas intenções, sem restrições mentais, e prosseguir invariavelmente nessa atitude retilínea, quer venham quer não venham resultados materiais. Se o homem se entristece quando não aparecem resultados palpáveis, é prova de que a sua atitude interna era falsa, que procurava secretamente subordinar o mundo espiritual ao mundo material. É claro que as leis da Constituição Cósmica não favorecem semelhante atitude. Só quando o homem é 100% desinteressado nos resultados materiais é que ele verificará que "todas as outras coisas" lhe são dadas, e precisamente porque ele não as procurou nem fez depender delas o prosseguimento da sua espiritualidade. É este o estranho procedimento de todas as coisas no mundo: quando procuradas e apetecidas pelo homem, fogem dele - mas, quando abandonadas por ele ou tratadas com serena indiferença e espontâneo desapego, então essas coisas correm no encalço do homem e se lhe oferecem.

Algum diz a Filosofia Cósmica descobrirá e definirá essa grande lei: que o homem meramente intelectualizado, sem espiritualidade, cria em torno de si uma espécie de campo magnético de atuação centrífuga, estabelecendo uma polaridade hostil entre si e a Natureza, que foge dele, repelida pelas auras negativas do homem luciférico; mas, assim que o homem ultrapassa a zona da mera intelectualidade e entra no mundo da racionalidade espiritual - eis que o campo magnético se inverte, passando a atuar em sentido centrípeto, como força de sucção, atraindo para o homem todas as criaturas da Natureza. Com outras palavras: o homem que não encontrou a si mesmo, o seu divino sujeito, afugenta de si todos os objetos em derredor - mas o homem que encontrou o reino de Deus em si mesmo atrai a si todas as criaturas de Deus. A auto-realização produz automaticamente as alorrealizações, mas a falta de auto-realização torna impossíveis as alorrealizações.

Em uma palavra: o único modo seguro e certo para realizar as "outras coisas" é o homem realizar-se a si mesmo, o "reino de Deus dentro de si".

Até aqui, pelo menos 90% dos nossos leitores - ou talvez 99,9 - já devem estar desenganados, porquanto é difícil criarmos dentro de nós esse clima de desinteresse em face dos resultados palpáveis dos nossos trabalhos. Para a imensa maioria dos homens da presente evolução, não há incentivo suficiente para um trabalho eficiente e constante quando não existe a perspectiva de uma recompensa correspondente em forma de resultados materiais.

                                                           * * *


A Filosofia, como se vê, é um tremendo desafio, uma escola de disciplina rumo à verdade; ela não é ocupação para personalidades fracas e vacilantes (instáveis), nem pode ser praticada como hobby em horas de devaneio e passatempo. Exige dos seus adeptos uma auto-educação tão sincera e retilínea que, segundo as palavras do divino Mestre, são "poucos os que trilham esse caminho estreito e passam por essa porta apertada", porta que, não raro, se assemelha a um "fundo de agulha". "Muitos são os chamados - poucos os escolhidos." Mas esses poucos dispostos a pagar o preço da sua auto-realização - se derão por muito bem pagos por toda a disciplina que, voluntariamente, tomaram sobre si, porque descobriram o "tesouro oculto" e encontraram a "pérola preciosa" da Verdade Liberdadora, que lhes abriu o cárcere.

Entretanto, se alguém quer saber em 2 ou 5 minutos se a Filosofia é aplicável à vida, ninguém lhe poderá dizer de um modo compreensível. O único mode de saber da Verdade é vivê-la em si mesmo - mas essa vivência não lhe pode ser dada por terceiros. Quem não viveu a Verdade não sabe o que ela é. O que os outros podem fazer é tão-somente preparar-nos os caminhos e criar em torno de nós uma atmosfera propícia. A experiência, porém, é algo eminentemente individual, instranferível, como o próprio ser de cada um.

E, uma vez solvido o problema central da vida humana, todos os outros problemas periféricos estão solucionados, ou em vias de solução.
Na realidade, não há nada mais "prático" do que a Filosofia.

"Quem puder compreendê-lo, compreenda-o!" '



"Há uma grande diferença entre 
conhecer o caminho e percorrê-lo"


sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Todo mundo é uma prostituta

Eu podia tá matando, podia tá roubando, podia tá tirando a cutícula e usando uma gola V decotada, mas estou aqui para compartilhar essa pérola com vocês:


A retórica da inflação de ego está em todo lugar. No trabalho, na escola e no shopping, os americanos esperam que todos digam o quão especiais, talentosos e importantes eles são. Em nosso mundo invertido, os fracos são fortes de alguma forma, aquele que sobrevive a uma cutícula arrancada é corajoso, e todo burocrata que trabalha para o Departamento de Defesa é um maldito herói.

Na GloboCorp, o departamento de recursos humanos tenta convencer cada fulano e cicrana que eles são absolutamente essenciais para o sucesso da empresa. Os talentos criativos de cada um são valorizados e todos, do zelador ao presidente, são capazes de fazer contribuições positivas tremendas. Em seu recente livro sobre o valor do trabalho, Matthew B. Crawford argumenta que corporações modernas desvalorizam conquistas significativas quando elas nos agradam e fala como se todo mundo fosse uma espécie de Einstein.

Os americanos gostam que seja dito que são brilhantes e corajosos, mas como um povo, esses não são mais os nossos valores mais elevados. Quem consegue nomear cinco recentes e legítimos heróis de guerra? A plebe tampouco se importa a respeito de quem é inteligente. Ela só liga para a ciência quando quer perder peso, vencer uma discussão na Internet ou descobrir de que modo o mundo irá acabar. Se você conseguir falar agora o nome de dez caras que fazem ciência de verdade, você provavelmente é um cientista.

A maioria das pessoas sabe que elas não são Einsteins e pra falar a verdade elas não ligam pra isso. Elas têm uma preocupação mais premente.

O que elas realmente estão se perguntando é: "sou gostoso(a) ou não?”.

Pessoas bonitas são os faróis mais brilhantes do nosso mundo flutuante. Modelos atraentes e atores recebem muito mais elogios e atenção do que condecorados com a Medalha de Honra. As pessoas amam tecnologia, mas a usam para "acompanhar os Kardashians"1. Elas lotam as academias, mas força e fitness são apenas subprodutos do seu desejo de serem desejadas. Ninguém liga pra quanto peso Tatum Channing ou Brad Pitt conseguem levantar, ou quão rápido eles podem correr, ou o que eles são capazes de construir, ou quantos caras eles conseguem derrotar em um combate. Eles são admirados por serem desejáveis.

Antigamente, apenas as mulheres jovens se preocupavam excessivamente em serem desejadas. Em sociedades patriarcais tradicionais, uma mulher a qual nenhum homem quisesse como esposa se tornaria um fardo para seus pais. Uma mulher não desejada nunca poderia se tornar uma mãe ou administrar uma casa. Ela seria para sempre uma filha dependente ou uma independente e solitária solteirona. Para mulheres em idade de casar, a atratividade tem um valor muito alto e, embora a sua importância diminua com a idade, a maioria dos homens ainda prefere ter uma esposa bonita a uma feia. Seja por hábito ou por natureza, muitas mulheres tendem a gostar de se pintarem e se adornarem para parecerem mais jovens, férteis, femininas e atraentes. 


 No entanto, de todas as mulheres, a que mais se importa em ser desejada é a prostituta, porque sua sobrevivência depende da sua habilidade de fisgar os homens em seus quadris.

Alguns apontarão para a ornamentação masculina como um contraexemplo, mas a motivação por trás do embelezamento masculino tem sido tradicionalmente diferente. Quando os homens se ornamentam, eles o fazem para parecerem mais temíveis ou para comunicar status. O Samurai usava vermelho, e como em muitos pontos mais delicados da higiene samurai, eles o faziam para que seus inimigos os respeitassem como oponentes viris, mesmo depois que fossem mortos. Eles não “davam um trato no visual” para transar. Eles o faziam para ganhar o respeito de outros homens.

No fim de semana passado, um filme sobre strippers masculinos faturou $39,2 milhões de dólares nas bilheterias. A América percorreu um longo caminho desde Flashdance.

Em The Way of Men, eu usei Bonobos e Chimpanzés para comparar a sociedade orientada para o sexo feminino com a sociedade orientada para o sexo masculino. Pessoas não são exatamente a mesma coisa que macacos, mas eu acho que chimpanzés e bonobos fazem metáforas reveladoras sobre a situação em que nos encontrávamos e para onde aparentemente estamos indo.

Os bonobos vivem luxuosamente, com acesso a tanto alimento quanto precisam. Coalizões de fêmeas reprimem a agressão masculina e os machos raramente formam grupos coesos. Os machos não sabem quem são seus pais, somente suas mães. O sexo é igual ao que a vadia de um bar disse uma vez a um amigo meu; “como um aperto de mãos". O homossexualismo é lugar-comum porque o sexo é uma atividade social e todo mundo faz sexo com todo mundo. Não se trata de reprodução; se trata de masturbação mútua e de se divertir. Costuma-se dizer que os bonobos são pacíficos, e embora isso possa não ser completamente verdadeiro, eles são definitivamente matrilineares e excepcionalmente “safados”.




Os chimpanzés formam grupos de caça patriarcais. Os machos permanecem juntos e as fêmeas acabam migrando de grupo pra grupo. O sexo é uma atividade reprodutiva. O homossexualismo é raro. Os machos dominam as fêmeas e aqueles que estão no topo da hierarquia masculina controlam todo o grupo.




A América está rapidamente se tornando a "Sociedade Masturbatória dos Bonobos", devotada ao prazer e organizada primariamente para servir aos interesses das fêmeas. Cada vez mais homens são criados por mães solteiras e os machos são desencorajados a organizar qualquer coisa sem a supervisão feminina. O sexo é social e a maior parte do trabalho duro e perigoso que os homens costumavam fazer, ou é feito por máquinas "à prova de idiotas" ou é terceirizado em países onde o custo de vida é barato. Mulheres e homens desonrados microgerenciam agressões masculinas com leis e processos judiciais sem fim, e bad boys que não podem pagar por grandes advogados são chutados pra dentro de uma multibilionária indústria prisional, que ostenta a maior taxa de encarceramento do mundo.

Em nossa sociedade masturbatória de bonobos, trepar é uma das únicas coisas que os homens são encorajados a fazer que os fazem se sentirem realmente como homens. 


Por todo o Alt-Right2, vários autores criticam a cultura PUA e o "game". Porque praticamente a única coisa viril que os homens estão autorizados a fazer é transar, eu sou mais simpático essas coisas. Eu vejo o que muitos chamam de game como um tipo de "acesso à masculinidade". Game é essencialmente um treinamento de assertividade para uma geração de jovens que passaram a maior parte de suas vidas brincando de "o mestre mandou"3.

Virilidade é como um talento. Alguns machos são mais dotados que outros, mas como qualquer talento, a masculinidade tem que ser pressionada e desenvolvida para significar algo impressionante. Garotos que foram criados por mães solteiras ou pais superprotetores e expostos ao sistema de lavagem cerebral feminista das escolas públicas, nunca foram postos à prova ou treinados por grupos de homens severos. Você não pode entregar um diploma de ensino médio a um guri pau-mandado4 e esperar que ele cuspa igual a Clint Eastwood.

Quando falam sobre game, os homens na “manosfera” estão escavando através das besteiras que o sistema diz sobre garotas aos garotos. Este é um trabalho que precisa ser feito. Se os caras medianos acreditarem na baboseira oficial que é dita sobre sexo e relacionamentos, eles serão usados e abusados pelas exigentes5 mulheres americanas pelo resto de suas vidas. E, na medida em que se desfaziam dos mitos feministas sobre os sexos, eu vi muitos desses caras começarem a se perguntar o que realmente significava ser homem. Essa é uma conversa importante. Entretanto, até parece um caminho mais seguro no clima cultural atual, fazer da perseguição à boceta uma opção de vida em longo prazo. É aí que as médias positivas deslizam em direção a um extremo negativo. Andy Nowicki escreveu que se os homens realmente querem minar o matriarcado, eles deveriam parar de foder. Ele pode ter suas próprias motivações (possivelmente religiosas) para dizer tal coisa, mas eu acho que ele tem alguma razão nesse ponto.

Nossas feministas manipuladoras e globalistas adorariam mais do que qualquer outra coisa, manter os homens jovens – o grupo mais perigoso e potencialmente revolucionário em qualquer civilização – completamente distraídos pela boceta. E, embora possa sentir como se estivesse afirmando sua dominância (covenientemente da forma mais inofensiva possível), se tudo o que você faz é designado a torná-lo mais atraente para as mulheres, você é um “vibrador ansioso”. Quando os seus músculos são apenas para exibição, quando tudo o que você faz é para torná-lo mais desejável, você está interpretando o papel feminino. Quando o seu valor como homem depende do número de mulheres que você consegue levar pra cama, você não passa de um gigolô.

Como Hunter S. Thompson notou, sexo é a maior diversão dos amadores. É maravilhoso quando você é jovem, bonito, ingênuo e despreocupado - mas "putas velhas não dão tantas risadinhas".

Mark Simpson tinha compreendido muito disso quando, lá em 1994, cunhou o termo "metrossexual". O metrossexual não é necessariamente gay ou efeminado no sentido extravagante da palavra - essa é a apenas a maneira como a palavra “pegou” entre as pessoas. A ideia de metrossexual de Simpson é de um "homem espelho" cujas maiores preocupações narcisistas são a busca do prazer e ser considerado "desejável". Ele pode estar apaixonado por si mesmo, mas isso também é um tipo de amor frívolo. Ele liga mais para a aparência e para quão bem ele fode do que para o que conquistou ou o quanto é respeitado. É uma vaidade de prostituta.

Hugh Hefner estava muito a frente do seu tempo. Foram os homossexuais que abriram caminho para o estilo de vida bonobo em massa. Antes que os PUAs de hoje estivessem na pré-escola, eles já faziam isso por causa dos números, à procura de validação, baseando seu valor próprio em "quantos" e "quão gostosos". Homossexuais rejeitam expectativas e papéis masculinos tradicionais e canalizaram toda a sua agressão masculina para o sexo e por causa do sexo. Sua ideia de masculinidade tornou-se masturbatória - um Tom of Finland bombado, uma caricatura de forma masculina, sem função, honra ou virtude. Os homossexuais, por serem “homens”, definiram o cenário cultural para a objetificação masculina da mesma forma que os homens sempre objetificaram as mulheres. 


Como bonobos desbravadores, os homossexuais descobriram as desvantagens do meretrício. Um “pegador”6 experiente se viu obrigado a adquirir um punhado de DSTs, e a AIDS praticamente dizimou uma geração inteira de homens "sexualmente livres". Para muitos, existem também muitos custos psicológicos. Ser desejado é uma droga viciante. E quando esse é o seu valor mais elevado, isso se torna sua identidade. Um dos problemas – coisa que sempre foi uma maldição feminina – é que a atratividade sexual está ligada ao instinto de procriação, e tem seu pico na juventude. Os homens envelhecem de forma mais suave que as mulheres, mas a maioria que barganha seu “sex appeal” não alcança de forma tranquila a masculinidade da meia-idade, confiante e segura, de seus antepassados. Como os homossexuais e estrelas de cinema, eu me pergunto quantos dos “pegadores” modernos sairão em busca de esteroides, Viagra, e eventualmente se convencerão de que talvez a plástica facial de Kenny Rogers fique melhor neles do que ficou neste. (Não ficará, camaradas. Vocês ainda parecerão com uma lésbica velha que não consegue piscar). Particularmente, existe algo de desesperado, triste e indigno em um homem de certa idade que gasta muito tempo buscando por validação sexual.

O que é pior é que os heterossexuais não estão no mercado para os homens; eles estão no mercado para as mulheres, de modo que a biologia os coloca em grande desvantagem. O “estrategista em game” Heartsite, recentemente postou sobre uma experiência de encontros online na qual os dois caras mais bonitos, em conjunto, conseguiram obter um total de 50 mensagens de mulheres, enquanto que as mulheres mais atraentes do site receberam mais de 536 mensagens de homens, no mesmo período de tempo. Esse “campo de jogo” nunca chegará perto de ver qualquer igualdade, mas o game está ganhando popularidade porque os homens enxergam essa disparidade e querem aumentar suas chances.

Homens com boa aparência e algum game podem ser capazes de manter esse ritmo pela maior parte de suas vidas e acabarão tendo boas histórias para contar. Uma pequena minoria de homens sempre foi libertina e provavelmente alguns estão particularmente bem adaptados a isso. Uns terão arrependimentos e outros não.

O problema não é o que acontece para uns poucos pegadores, mas o que nos tornamos enquanto sociedade quando todo mundo quer ser pegador. A libertinagem costumava ser uma forma de rebeldia, mas cada vez mais faz parte do esquema. Em uma sociedade onde o sexo e a atratividade são os valores mais elevados, o que acontece com os outros dois terços da curva?

A carne não será democratizada. A atratividade não é mais uniformemente distribuída do que a força, o tamanho ou QI. O mundo é cheio de gente feia e gorda. As pessoas podem melhorar bastante com dieta, exercício e higiene – e deveriam –, mas você pode colocar batom em um porco e ainda assim ele continua sendo um porco. Alguns homens e mulheres simplesmente não têm uma boa aparência. Várias pessoas são, na verdade, bastante repulsivas. Algumas provavelmente deveriam evitar a luz do dia por completo, porque elas amedrontam as crianças pequenas.

As mulheres sempre foram conscientes do elitismo cruel da hierarquia natural da beleza. Em sociedades nas quais outras virtudes tiveram um valor maior, elas poderiam se concentrar na piedade ou simplesmente em serem boas mães. Quando as mulheres foram “sexualmente libertas”, algumas feministas (principalmente as gordas e feias) acharam que poderiam contar com o condicionamento social para dar a todos nós óculos com “visão de cerveja”7 permanente e tornar cada bruxa velha e inchada tão desejável quanto Heather Locklear. Se o problema fosse apenas da Barbie ter proporções realistas, ou de sermos forçados a ver mais obesos mórbidos na televisão, então, menos lágrimas cairiam nos potes de sorvete. Mas elas fazem pressão é pela “aceitação das gordas” e continuam nos dizendo que “o volumoso é belo”. Quando isso não funciona, elas nos represam com clichés ruins e tentam nos convencer de que a beleza ou está nos olhos de quem vê ou “no interior”. Nós podemos patrociná-las ou tentar ser mais sensíveis, mas fingir que todos são igualmente belos é tão absurdo e incorreto quanto fingir que todo mundo é um Einstein.

Ninguém quer uma boneca Barbie com canelas grossas8 e a desobjetificação das mulheres está em desacordo com o Zeitgeist da nossa ultra-sexualizada sociedade masturbatória de bonobos. Andrea Dworkin9 perdeu, e mais do que nunca garotas adolescentes estão assistindo pornô hardcore para aprender como rebolar, socar uma e engolir como as “profissas”. Eu vou para a academia e vejo caras que não estão ali para levantar ferro ou ficarem monstros. Eles estão seguindo treinos para “secar” e construir um corpo “para as gurias”. Essas gurias estão pegando um bronze, recebendo implantes nos seios e tentando ficar parecidas com strippers. Um amigo que ensina em uma escola da Califórnia disse que eles tiveram que cancelar o dia de Halloween porque as crianças não queriam mais ser assustadoras nem fofas. Os garotos e garotas, de modo idêntico, estavam usando o feriado como uma desculpa para irem à escola o mais próximo de nuas que era possível. 


 As pessoas costumavam ter aspirações mais decentes. Elas queriam formar famílias.las queriam fazer um bom trabalho. Queriam ser bons cidadãos, bons Cristãos, ser uma boa pessoa. Agora todo mundo quer ser pegador e estrela pornô. Todo mundo quer ser o tipo de macaco no qual os outros macacos querem se esfregar.

Nós chamamos essa orgia matrilinear de “progresso” e buscamos a nossa redenção moral na reciclagem.

Sexo pode ser natural, e com certeza é divertido, mas é apenas uma parte da vida. Uma sociedade que põe ênfase excessiva no sexo a ponto de parecer que a única coisa que significa algo na vida é grotesca e degradada, e que, para a maioria das pessoas, resulta mais em um vazio do que em êxtase.

Em patriarcados saudáveis, os homens se forçam a ganharem o respeito e a admiração dos outros homens. Eles trabalham para provarem sua força, coragem e competência uns para os outros. Os homens se orgulham de sua reputação pelo domínio dos seus corpos, suas ações e seu ambiente. Eles querem ser conhecidos pelo que são capazes de fazer, não apenas por quão bem ou quem eles fodem. E com certeza eles não perdem seu tempo tentando descobrir o que eles podem fazer para impressionar uma vadia burra.

Puta merda, em alguns lugares, quando um homem está pronto para arranjar uma esposa, ele apenas escolhe uma e a sequestra. Os homens costumavam se casar e tocar suas vidas. Parece um caminho de vida mais saudável para mim e eu tenho visualizado o que o outro lado tem a oferecer.

Recentemente, eu assisti Restrepo, um documentário sobre soldados lutando no Afeganistão. Tinha uma cena onde os americanos tinham que negociar com anciões de tribos locais. Os anciões eram um bando de caras velhos com um olhar muito sério e suas longas barbas eram vermelhas brilhantes tingidas com rena.

Nossos “aliados” tribais no cemitério dos impérios [Afeganistão] têm lá seus problemas. Eles cagam nas próprias mãos e estupram garotinhos. Seus costumes deixam espaço para muitas melhorias.

No entanto, enquanto eu assistia seus olhos sérios, eu me perguntava se qualquer um daqueles homens perdeu muito tempo se perguntando, “sou gostoso ou não?”.





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1. Referência ao reality show Keeping Up with the Kardashians.
2. Alternative-Right (http://alternative-right.blogspot.com.br/)
3. “Mamãe, eu posso?”, ao pé da letra.
4. hen-pecked, dominado, capacho, escravo de boceta ou “mangina”.
5. entitled, intitulada ou “cheia de direitos”.
6. player, jogador, o cara que faz uso do game.
7. beer goggle, efeito causado pela bebida alcoólica que torna as outras pessoas mais bonitas aos nossos olhos.
8. cankles {calf (panturrilha) + ankle (tornozelo)}. Quando a perna tem praticamente o mesmo diâmetro em toda sua extensão e dá um aspecto de “roliço”, comum nas pessoas gordas.
9. Feminista famosa por fazer ferrenha oposição à pornografia.

Escrito por Jack Donovan
Traduzido por Lucas