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quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Por que a fama e o sucesso são tão importantes






Mais do que nunca, se busca a vitória, o sucesso e a fama. Mas poucos param pra pensar no que significam essas coisas. São conceitos relativos e subjetivos, é claro; embora haja pontos comuns nessas definições que são aceitos por quase todos nós.

O que me trouxe ao estudo da natureza e da base dessa busca, desses conceitos e da mentalidade que sustenta esses valores foi justamente entender o motivo da profunda insatisfação e miséria interior que experimentam as pessoas que parecem mais ter se aproximado do que quase todos buscam e admiram.

Não vou tratar aqui de clichês de usar como exemplo atores de hollywood, jogadores de futebol, ou esportistas famosos. A razão da derrocada de celebridades é popular, bem conhecida e relativamente simples de ser evitada. Pretendo tratar nessa breve reflexão é do motivo que trouxe a sociedade atual a valorizar tanto a ascensão social, financeira, carreirística, entre outras.

Pode parecer que a busca pela competição e pela luta entre os seres é algo completamente natural, que sempre existiu. Mas não é bem assim. A disputa e a luta são componentes da vida, não seu objetivo maior. Há situações específicas em que aparece a luta, mas ela só se justifica em função de outras coisas. Por exemplo, a leoa que mata uma zebra para dar de comer a seus filhotes está lutando contra a zebra (meio) para alimentar seus filhotes (fim). Como você pode fazer da luta o centro dos acontecimentos? Se esse fosse o centro a leoa poderia se dar por satisfeita ao matar a zebra e ir embora, se esquecendo de levar a comida a seus filhotes, mas isso não acontece.



É curioso observar hoje em dia, como vemos por todos os lados pessoas que vivem "na luta", que buscam "a felicidade". Vemos aí um meio e um sentimento sendo colocados como um fim e uma sensação que deve ser buscada a todo momento, como se a vida estivesse completa assim que a felicidade possa ser plena e constante. Conceitos assim aplicados levam aos clichês que vemos tanto de pessoas lutando a vida toda para ter mais e mais dinheiro, ou mais e mais fama, ou mais e mais sucesso seja na sua carreira, ou na vida social, ou onde for. É como se a vida fosse uma eterna jornada de disputa, superação e competição com os outros. Mas aí todos dirão - "ah, mas eu luto para ser alguém na vida, para me sustentar, para manter a minha família" - sim, isso é necessário, mas perde totalmente o sentido quando se torna um fim em si mesmo, como expliquei no exemplo da leoa e seus filhotes. Se torna um problema algumas vezes patológico quando o trabalho ou qualquer tipo de luta e ambição se tornam o fim na vida de alguém. É nesse ponto que a ambição e a ganância se transformam de virtudes em males. Não é raro por exemplo ver pessoas que já têm uma reserva de dinheiro para várias gerações e ainda assim não conseguem parar de trabalhar incessantemente ou de dedicar a maior parte do seu tempo, saúde e atenção para isso. Vindo até mesmo a padecer de males pelo excesso nessas atividades, só para conseguir um pouco mais, elevar um pouco mais o padrão de vida.
É aí que o que vem de fora se torna maior do que se tem por dentro. E esse conceito aplicado dessa maneira só aparece na história da humanidade a partir de certo ponto.

Desde o início dos tempos os seres humanos tinham consciência de que viviam dentro de uma esfera de experiências ilimitadas, mas sujeitas a leis de possibilidades físicas e mentais; enfim, leis universais. A partir do momento em que a noção dessas possibilidades é perdida, surge a necessidade individual de limitação dessas possibilidades, pois ninguém suportaria viver num contexto de total abertura em todos os sentidos e possibilidades, em que não há mais a noção da impossibilidade que limita o ilimitado. O conceito dado por Alexandre Koyré em seu livro O Universo Infinito trata exatamente disso. Das limitações que o próprio ser humano cria para si mesmo dentro do infinito de possibilidades. É a partir daí que são formados diferentes áreas e nichos de interesse e atuação social, profissional ou mesmo de lazer e hobbies. Cada pessoa inserida nesses diferentes contextos pode desenvolver o nocivo hábito de julgar aspectos de meios e áreas que não compreende, baseados nos aspectos que são capazes de compreender e explicar, baseados em suas experiências ou nas dos que o cercam. Assim criam uma espécie de mundo fictício para si, onde tudo funciona de acordo com a lógica e as bases pré-estabelecidas criadas por si mesmo; um tipo de ilusão auto-infligida inconsciente; uma vez que a pessoa raramente é capaz de notar que baseia suas impressões e opiniões em conceitos que podem não se aplicar ao sujeito dessas ações. Essa disparidade geralmente é aceita e relevada em questões minoritárias, mas raramente percebida e atenuada em campos mais abrangentes e mais solidificados por um processo histórico. Por exemplo: um sujeito é capaz de compreender o flagrante desinteresse do outro por sua paixão pela física quântica, mas não hesita em tomá-lo por tolo quando ele diz não partilhar da sua fé, ou de ambições financeiras e sociais almejadas por todos.

Como demonstrado, esses parâmetros aparentemente universais não passam de construções sociais, temporais ou mesmo geográficas. É assim que no decorrer dos séculos, essa incapacidade de compreensão universal passa a influenciar pensadores, teóricos, filósofos e cientistas, e começam a surgir teorias e construtos sociais embasados por esse equívoco sutil mas tremendamente significativo. As pessoas começam a acreditar estarem vivendo num contexto de total liberdade (especialmente nos dias de hoje quando gozam de liberdade física, financeira, espiritual, intelectual, etc), mas tem sua visão completamente estigmatizada por essa patologia cognitiva; e passam, assim, a vivenciar aquilo como um sonho acordado, acreditando que aquilo é realmente o mundo.

Para simplificar: se você está lendo um livro e algum ruído o incomoda, sua iniciativa é primeiramente de abstrair aquela distração e não prestar atenção nela. Funciona como uma defesa automática contra tudo o que interfere no enredo que lhe interessa verdadeiramente. Hoje as pessoas chamam esse processo de ter uma "opinião" - da qual os outros podem concordar ou discordar, mas nunca se ausentar completamente daquela ideia. Quando duas pessoas concordam acerca de um assunto, significa que elas possuem um mecanismo de defesa comum em relação a distrações que possam vir a perturbar o funcionamento daquele espetáculo que se passa em suas mentes. É assim que se estabelecem e se mantém a maioria das dinâmicas sociais e relacionais atualmente. As pessoas se isolam em grupos de interesses comuns e ignoram direta ou indiretamente, total ou parcialmente tudo o que foge do centro daquele pseudo-universo.

Assim a ideia da sobrevivência do mais "capaz", "preparado" e "bem sucedido" passa necessariamente por esse filtro comum, ditado sempre pelos poucos que controlam os rumos da sociedade, usando os demais como massa de manobra para ampliar suas ideias e o efeito delas sobre os demais. Cria-se então, com certa facilidade, a ideia de que seguir aquele padrão de condutas e conquistas representa o sucesso e bem-estar, para todos!
É incrível como é comprada com facilidade a ideia de que bilhões de pessoas devam buscar as mesmas coisas para se realizarem, num mundo em que tantos se dizem originais, personalizados e únicos; ainda que pensem e ajam quase que exclusivamente da mesma forma (salvo variações mínimas que na maioria das vezes servem para criar uma ilusão, uma aparência de diferença e originalidade). Não demora então, para que se crie então uma convergência de argumentos materialistas ou pseudo-religiosos para incorporar a ideia da fama e do sucesso à da sobrevivência. O sujeito que é "bem sucedido" na vida (segundo os viciados padrões estabelecidos a priori), passa a ser portador do mérito, e então aparece aí a ideologia de adoração do sucesso - o sucesso é a obrigação de todos os seres humanos.

É desnecessário explicar que a quantidade de pessoas que conseguem ter a mais sutil consciência desse processo, são justamente as que são excluídas (ainda que discretamente) do centro do convívio social, das páginas, dos cliques e holofotes. São pessoas cuja existência passa marginalmente pelos demais. O curioso é que anos, décadas ou séculos mais tarde, venha a se perceber que as pessoas que mais fizeram diferença real para o progresso das demais são na maioria das vezes, como essas que são tidas por lunáticas, desajustadas, excêntricas ou perdidas (notem que os adjetivos para qualificar pessoas que não entram de cabeça na dinâmica social dominante são sempre subjetivos e relativistas). Mas ainda assim a mediocridade e o espírito de bando reinarão sempre que a opinião da maioria for tomada como lei (não sou contra a democracia política, apenas ideológica), portanto continuaremos a ver por um bom tempo ainda essa entropia de ideais, objetivos, auto-promoções, e pessoas que são adoradas e preteridas quando se vendem como produtos em redes sociais, ou demonstram algum destaque em determinado setor. Essa é a sina dos que se recusam a questionar coisas tão importantes como suas motivações próprias e o real valor daquilo que mais almejam. Para os pequenos de alma, realizações materiais, sociais ou profissionais vão bastar, não adianta tentar abrir-lhe os olhos.
Para os demais, deixo o meu boa noite!




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